De Palomas

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Duzentos anos de Anita

Heroína de dois mundos

Possivelmente ela seja a personalidade mais fascinante da revolução farroupilha. Nascida em 30 de agosto de 1821, Anita Maria de Jesus Ribeiro entraria para a história como Anita Garibaldi. Destemida e apaixonada, fez o que não se imagina numa mulher do seu tempo. É verdade que se costuma reduzir o feminino no passado a um modelo que, volta e meia, a história desmente. Ao menos, algumas figuras destoam. Anita, cujo marido a trocara pelo exército imperial, não hesitou em viver a sua paixão por Giuseppe Garibaldi. É história sabida por todos nós que vivemos neste espaço histórico, neste imaginário de luzes e sombras. Nos duzentos anos de nascimento da guerreira, porém, a gente para e pensa: que mulher! Que coragem! Que paixão! Nada pode detê-la.
Ah, se Hollywood realmente se interessasse pela nossa história. Anita amou muito, lutou, comandou, arriscou-se, defendeu ideias e exibiu coragem para dar e vender. Quando eles se conheceram, Anita tinha intrépidos 18 anos de idade; Giuseppe, 32. Como numa história de amor de folhetim, enfrentaram episódios incríveis, tiveram filhos, casaram-se, partiram juntos para o Velho Mundo, onde continuaram a viver o que não estava ao alcance dos comuns, e ficaram juntos para sempre. A vida dela foi curta e intensa. Morreu em 4 de agosto de 1849. Não chegou a completar 28 anos. Fã que sou da atriz Ana Paula Arósio, gostei de vê-la no cinema interpretando a heroína de dois mundos. Giovanna Antonelli também foi bem como Anita na televisão.
Anita de batalhas, fugas, desejos, ideais, um grande amor, filhos, dores, sofrimentos, aventuras e uma profunda fidelidade a si mesma. O fantástico em Anita é que ela arruma e desarruma o imaginário dominante sobre a mulher do seu tempo: foi amante e mãe, mas foi também guerreira indomável. Viveu o seu amor até a última gota sem se restringir ao figurino da senhora do lar. Anita foi mulher moderna antes de a modernidade se tornar uma ideologia fechada e excludente. Gosto de imaginá-la cavalgando. Como não pensar em Garibaldi arriscando tudo numa declaração: “Tu deves ser minha! – Eu falava pouco o português, e articulei as provocantes palavras em italiano. Contudo fui magnético na minha insolência. Havia atado um nó, decretado uma sentença que somente a morte poderia desfazer. Eu tinha encontrado um tesouro proibido, mas um tesouro de grande valor”.
Ela seria dele. Antes de tudo, seria de si mesma, do seu jeito, dos seus sonhos. Há pessoas que parecem nascer para desafiar costumes e viver à frente do próprio tempo. Anita fez a sua época comer poeira. Integra um panteão reservado a poucos. Sempre que penso em Anita, acabou por pensar no quadro de Eugène Delacroix, “A liberdade guiando o povo”. Por que não romantizar um pouco? Por que não se emocionar? Anita me deslumbra. Um amor assim merece respeito. Muito respeito. O século XIX teve mulheres fantásticas. Anita é uma delas. Dona Leopoldina, a primeira esposa de D. Pedro I, é outra. Numa época patriarcal, mulheres fizeram chover. Anita sempre nos representa.

 

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