Percepções – 19/06/2021
Crônica e eternidade
Sempre procuro temas que venham de encontro ao que os leitores desta coluna gostam e assuntos que de alguma forma acabam impactando em minhas leituras. As vezes coloco notícias diversas, em tópicos, crônicas, fatos do cotidiano e em outras transcrevo, de forma seletiva, o que desperta minha atenção, como a crônica do mestre Juremir Machado, a quem dedico profunda admiração e respeito, sobretudo por sua inteligência e emotividade. Confira:
“O cronista finge que escreve sobre o presente. Na verdade, só lhe interessa a eternidade. A maior mentira já dita sobre a crônica é que ela é perecível. Não. Perecíveis são os comentários atrelados a fatos. A crônica é um fingimento do bem. Finge falar do pequeno para se encastelar nas estrelas. Como saber se um texto é uma crônica? Se, embora leve, nunca perder seu peso e sua atualidade. De resto, todos os gêneros são cercadinhos fadados ao fracasso. O escritor pula a cerca. Capistrano de Abreu queria saber se “Memórias póstumas de Brás Cubas” era romance. Machado de Assis respondeu que sim e que não, a mais precisa das respostas do gênero, “que era romance para uns e não o era para outros”. A crônica engana todas as balanças. Só fala de coisas essenciais: a alma, a vida, a morte, passarinhos, as flores. Não se ocupa do que não tenha peso na vida. Quem trata das coisas passageiras são os economistas e comentaristas políticos. A maior vaidade do cronista, que para ser cronista precisa ser humano, demasiadamente humano e paradoxal, é querer ganhar prêmios. Eu já quis. Levei, não levei outros que me pareciam mais merecidos. Uma senhora de 99 anos, Dona Arlinda, me deu uma lição inestimável quando me queixei: ”Ninguém é obrigado a gostar do que a gente faz, menino”.
A grande obra força a pessoa a falar dela. Já notaram como Machado de Assis, Guimarães Rosa e Mario Quintana fazem falar deles? Abre-se a boca e quando se vê salta uma frase de um deles. É tanta frase bonita, tanta palavra esquisita que nem em sonhos falei… Viram? A gente imita, parafraseia, copia. Essa história de que tudo depende do gosto de cada um está mal resolvida. Se eu soubesse como resolver, contribuiria para a história da humanidade, que é um dos meus mais modestos desejos, junto com a vontade de morar na lua. Tenho certeza de que deve existir vida extraterrestre, até mesmo um planeta no qual todos os habitantes são cronistas e todos leem uns aos outros.
Se o cronista finge, nunca mente. Como pode ser? Que contradição é essa? Não é contradição, mas paradoxo, nome que damos às contradições que amamos. O cronista mata o tempo dos outros com suas ninharias fundamentais. Homens engravatados têm mais o que fazer. Será possível ainda hoje escrever crônica de gravata e paletó? Ainda se diz paletó? Uma vez uma moça me criticou por ter chamado terno de costume. Admitia que chamasse de fatiota. Era uma personagem de Balzac. Há muito desisti de separar a ficção da realidade. Velhos cronistas dão conselhos como quem dá balas a crianças. Eu sempre atraio tutores. Conheci um simpático leitor que quer me indicar livros e fixar tempo para eu mostrar que incorporei os novos conhecimentos. Muitos tentaram. A minha rebeldia frustrou todos eles, inclusive os que queriam me ensinar a escrever romances. Poesia, não me deixam. Julgam que o céu é muito longe a olho nu”.
*Umas & Outras
Maria Tereza Jorgens Bertoldi é o nome da jornalista que homenageou nosso colunista Potoko. Por falha minha, escrevi seu nome de forma equivocada. Feito o reparo. *** Luiz Paulo Dutra esteve na redação do Correio do Pampa na quinta-feira. Foi um prazer ouvir suas histórias e lembrar de tempos passados. O Grêmio Santanense continua vivo para seus torcedores. Tomara que no futuro possa retomar suas atividades. *** Na terça-feira,22, às 19h30, retomando as Lives do Correio do Pampa, com transmissão pelo Face, vamos conversar com o juiz criminal Gildo Meneghello sobre um tema muito atual: “impunidade”. Imperdível! *** Como se pode dizer que Livramento/Rivera é uma cidade única, quando a vacina aplicada nos Riverenses não pode ser aplicada nos Santanenses? O vírus conhece fronteiras? Se somos um só, o momento de provar é agora, durante a pandemia.
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