O VELHO BOLICHO DE CAMPANHA
Quero me referir a um costume muito típico, já que isso vem desde os primórdios da formação histórica do Rio Grande. Naquela época, o gaúcho, ou campeiro, tinha obrigatoriamente partir para as compras. Devido as distâncias, cavalgava-se muitas léguas para chegar a um “bolicho” de beira de estrada. Comprava erva-mate, açúcar, sal, fumo, rapadura, uma roupa, um caneco, um prato ou panela. Acredito que ainda existam algumas vendas e bolichos no interior de nosso município. O viajante inglês John Luccok registrou esse costume, na Vila de Rio Grande no inicio do século XIX: “Vou aludir aos forasteiros que aparecem para fazer compras, vindos do interior longínquo. São as mais das vezes homens baixos e robustos cuja mestiçagem com sangue índio se denuncia na barba rala, nos cabelos finos e nos olhos vivos. Embora sejam numerosos, especialmente os de mais modesta condição, pouco se ligam com os habitantes locais e se retiram ao cair da tarde para os seus acampamentos na planície, a quatro ou cinco milhas de distância. Vêm quase sempre em pequenos grupos, apeiam à porta da venda, sem dar palavra ou atenção a ninguém, e atiram as rédeas para o pescoço do cavalo. Entrando na venda põem-se a passar os olhos pelas mercadorias, até que alguém deles, topando com um artigo de que precisa, aponta para ele, troca umas poucas frases, indaga o preço e paga imediatamente. Tornando à inspeção interrompida, olha, aponta outro artigo, adquire e paga. Assim procede todos até gastarem o último dinheiro, se encontram na venda tudo o de que precisam. Parece não terem a menor ideia de diferença de qualidade, de variação de preço, nenhuma compreensão do que seja abatimento. “Os artigos que essa gente adquire são muitos, mas em pequena porção. Eu tenho ficado maravilhado com o cuidado com que eles – sendo quase sempre analfabetos e não sabendo aritmética – fixam na lembrança o preço de cada um. Procurando recorrer a lembrança, enfileiram os artigos na ordem em que os vão adquirindo. Passeiam por eles os dedos repetidamente como se estivessem a conferi-los por alguma lista, trazidas de memória, e vão recontando, em separado, o preço de cada qual. Quando a lembrança lhes falha, ficam impossibilitados de prosseguir nas compras. Se dois grupos chegam juntos a uma venda, raramente põem-se em contato, e o sentimento que os assalta parece ser o receio de que ambos precisem dos mesmos artigos e o suprimento não chegue a todos. “Para miudezas têm sacos de algodão que, quando cheios, amarram-se às selas; as chitas, levam-nas em geral envoltas em seus corpos; as lãs são dobradas em forma quadrangular e postas nos cavalos debaixo dos arreios. Em razão disso, muitas vezes todos os esforços e despesas feitos pelos fabricantes para o realce de sua mercadoria são utilizados no lombo suarento de um cavalo.” Concordamos que esse registro exemplifica um dos costumes do gaúcho antigo e, que ainda possa existir em nossos dias no interior da campanha com algumas diferenças.
Deixe um comentário
Warning: array_merge(): Expected parameter 1 to be an array, int given in /home/correiodopampa/www/wp-content/plugins/paid-memberships-pro/includes/content.php on line 266